Olhava o córrego refletindo nesgas de céu
e o comparava a sua própria existência:
também transitara por leitos a si destinados
refletindo nesgas de céu, sem contê-lo;
às vezes, com a impessoalidade do espelho
outras, com projetos somados ao que refletia.
O anzol sequer dava sinal de esperança ou vida
(vida que a minhoca, embora a luta, entregara)
diante do descompasso e enfado dos peixes.
Ora, como peixe desprezara tantos anzóis
por sabê-los engôdos que a dor contém;
como minhoca, dera a vida a anzóis errados
atraindo olhares e ações gulosas.
Só anzol não fora, assim pensava... ou fora?...
De repente, agitação na linha e na água,
um idiota, como ele, vencera a dúvida
e se jogara, corpo inteiro, ao destino.
Era a vida presa aos enganos e curvas,
de novo atraída pelos encantos do proibido,
debatendo-se vã, às forças últimas...
Puxou a linha, à ponta, um peixe pequeno,
boca dilacerada, sufocando no gasoso,
extinguindo a vida, rebelada e vã
à morte que vinha, que vinha, que vinha...
Berrou, então, ao ouvido do peixe:
"Idiota!" e o enviou de volta às águas...
Encerrou a pescaria sem haver pescado
nada além do que um pouco de si mesmo,
refletido que estava na história vivida...
Aos amigos diria, mais tarde, sobre pescaria:
"Meu maior peixe é o amanhã que sou
sendo a vida a maior de todas as pescarias!"
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ResponderExcluirRevisitando talentos: Itagiba Perrone é uruguaianense. Poderiam dizer que está perdido em Porto Alegre. Mas não. É um poeta e advogado, achado em Porto Alegre. Não necessariamente nesta mesma ordem, poeta e advogado, porque na verdade a ordem é concomitante: o menino que se esforçou e lutou para chegar onde está; o poeta que foi crescendo desde sua menina-poesia, até à grande arte que cultiva; o advogado. Juntando todos estes atributos, moldados na mesma cepa, deu no que deu: um ser humano ímpar, verdadeiro amigo e fiel a todos, à família, aos companheiros e destaca-se no Direito, onde não busca notoriedade ou fama, mas trabalha incansavelmente pela verdadeira justiça, aquela que ele tem na alma, se reflete na justiça do que faz e muito bem feito, e ainda se banha nas águas cristalinas da poesia. Descobri este poeta há vários anos, por um desses felizes acasos da vida. Descobri é um termo bastante pretensioso, que prefiro mudar para: tive a honra de encontrar e de editar seu segundo livro: Bolinha de Vidro, anos atrás, já que o primeiro, Metamorfose, havia sido editado anteriormente. De lá para cá a minha vida deu muitas voltas, mas nunca o perdi de vista. Sempre que o procuro, o encontro do mesmo modo, em sua trincheira de trabalho, onde reveza, Direito, cultivo às amizades e dedicação à poesia. Mais recentemente, escreve contos, também. Faz tudo misturado. Nas esperas nos corredores dos forum, em todo o lugar, vai anotando na agenda suas idéias poéticas; verdadeiras pérolas que temos que trazer a lume. Itagiba é um filósofo, não de intrincadas teses, mas do cotidiano e nos atinge na alma, coração e vida, com suas mensagens lítero-poéticas. Tem uma extensa bagagem que pretendemos editar. (Luciana Carrero, Produtora Cultural, reg. 3523, na Secretaria Estadual de Cultura, Porto Alegre/RS)
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