segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

SEM HORIZONTES



Em meio ao nada,                    A arma dispara
Um quase nada                        Na cara
Espera                                      Da mata,
Outra coisa,                             Reluz a cruz
Outra estrada,                          Carregada
Quimeras!                               Em ombros
Zumbido                                 Do tudo ou nada,
No ouvido,                              Nos tombos,
Poeira no olhar                        Nas quebradas
Alarido das feras                     Da monotonia,
Na capoeira                             Nas sombras do dia
O trejeito                                 O mesmo de sempre
A esmagar                               Perdido, ido,
No peito                                  Parido
A carga                                   Pelo mesmo ventre.

DESMORONAMENTO

O que posso querer mais
Se o trigo que me ofereces
Reverte em pão e em prece

O que podes querer tanto
Se nada falta em ti ou comigo
Exceto o amor que em nós falece

Esqueces se o que foi nosso passado
Não mais consegue lubrificar egos
Turvar visões destes pobres cegos

Do pouco que nos resta do inusitado
Inexistem sobras, mais nada enxergo
Além do paradoxo assim consumado

Então, se bem sabes que trigo e pão,
Além do abrigo e prece, ao coração
Fenece em inalcançável absurdo

Habita em nós um desvirtuado tudo
Nesse medo que nos torna mudos,
Presos à heresia dessa destruição...

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

ANOTAÇÕES PARA UM VIVER MELHOR

Votos de Feliz Natal e Próspero 2015, com muita Paz, Saúde e Sucesso para todos os amigos e seus (e meus) familiares. A propósito, segue texto/ensaio que expressa meu desejo de que tudo dê certo, sempre, para todos:

ANOTAÇÕES PARA UM VIVER MELHOR
Itagiba José
Ninguém nasceu para sofrer! Cada um recebeu gratuitamente o sopro de vida que nos mantém plenos na graça. Cada ser vivo é um vencedor. Sem saber, participou de uma disputa ferrenha, inimaginável, inumerável e a venceu! Por isso somos vencedores! Todos!

A disputa, no caso do ser humano, é aquela em que milhões de espermatozóides são lançados no fundo de uma mulher e somente um, aquele que carrega em si as características que definem o zigoto e o embrião, o que, à final, resulta em uma pessoa, fecundado o óvulo.

Segundo apurado pela ciência, dessa disputa participam, em média, cento e vinte milhões de espermatozóides. E só um consegue chegar à frente dos demais, vencendo outros cento e dezenove milhões e novecentos e noventa e nove mil e novecentos e noventa e nove. Fosse qualquer outro espermatozóide a fecundar o óvulo, ambos compondo com seus gens o zigoto, o embrião que resultará no feto e finalmente na pessoa que és, o milagre e graça da vida se faria e resultaria em qualquer outra pessoa, menos tu.

Nenhuma vitória, ou quem sabe, quase nenhuma, supera esta. A vida quase ou totalmente de graça. E nem sabíamos que participávamos disso, mas vencemos e estamos aqui. Este é o primeiro dentre tantos outros milagres da vida que temos e que pululam cotidiana e rotineiramente em nós, no nosso ser, como um todo, processando-se uma quantidade enorme de fenômenos que não dominamos e muitas vezes nem sabemos existentes, mas que mantém o sopro de vida que recebemos e devemos cultivar. Um exemplo, ninguém pensa quando respira, é automático. Tivéssemos que pensar para respirar certamente muitos morreriam de distração...

Por isso o ser humano nasce para ser feliz. A felicidade está nele que muitas vezes se equivoca e a busca fora de si. Cada pessoa é um universo e todos, paradoxalmente, são iguais em suas desigualdades. Em algum ponto, “A” é melhor ou pior que “B” que, por sua vez, em outro será melhor ou pior que “A” e assim, sucessivamente, ocorre com todos... Reconhecer tanto é um dos caminhos para alcançar a harmonia interior que logo adiante resulta na adequação do “eu” com o “nós”, busca que todos devem realizar, afirmando-se como ser humano útil, iluminado. Muitos se confundem e, ao contrário de projetar à estrada a luz que detém, mostrando o caminho, preferem focá-la nos olhos dos outros, cegando-os, esquecidos ou desprezando o milenar aforismo expresso pelo milenar Confúcio: “Aquele que sabe e sabe que sabe é um sábio, siga-o. Aquele que não sabe e sabe que não sabe é um humilde, ajuda-o. Aquele que sabe e não sabe que sabe está dormindo, acorda-o. Aquele que não sabe e pensa que sabe é um idiota, afasto-o.”.

Uma pessoa feliz, no mínimo, é um problema a menos neste mundo conturbado, por nossa própria culpa, em que vivemos. Uma pessoa feliz não espera que outros façam por ela, ao contrário, busca fazer pelos outros.
Uma pessoa feliz aprende que o mesmo esforço, negativo, que traz a inveja em seu bojo, pode e deve ser transformado, positivamente, em admiração e aplauso. Uma pessoa feliz, em si se basta plena de amor e fraternidade e logo descobre que tais sentimentos somente se realizam e se multiplicam infinitamente, em todo seu esplendor e eficácia, quando ofertados aos outros. Guardados, mínguam, fenecem; ofertados sem limites, vicejam e se reproduzem em quantidade e velocidade ilimitadas...

Todavia, não esqueçamos nunca que para ser feliz é imprescindível estar vivo e em paz consigo mesmo. Viver o agora é solução mais do que adequada às agruras e desconfortos que criamos. Há muita luz e sabedoria no aforismo latino, “carpen diem” (aproveitem o dia), necessário que saibamos a profundidade e essência dessa diretriz. O poema que segue, salienta o quanto de luz e sabedoria está contido na vivência plena desse “agora”; simples e objetivo, deixa claro que o amanhã não existe neste hoje em que celeremente passamos (diz-se “passamos” porquanto o tempo é imutável, inumerável, não passa, nós é que nele passamos; por isso, também nos equivocamos quando dizemos “não temos tempo...” pois não se pode ter menos ou mais daquilo que não temos, porque é o tempo que nos tem, marca e faz crescer como seres de luz ou em lastimável escuridão, a opção é nossa, consagra, desdobra e enlaça o tudo no nada e vice-versa, indo à frente, sem retorno, a caminho do sempre...). Eis o poema:
AGORA
O dia foi destinado para ser vivido. Ativo.
A noite, para o descanso. Brando.
Do destino virá a morte, sem aviso
De quando e onde se fará o encanto.
E o descanso, dizem, eterno será (?).
Dia ou noite não importa o fim ocorrerá!
Vive todos os momentos, noites, dias
Intensamente, sem queixume, satisfeito,
Sem amargura, ciúmes ou agonia,
Neste mistério, vida, graça e fulgor
Que o agora te oferece e insiste,
Desabrochando o amor de que és feito.
Eis que o amanhã é mera fantasia,
Poderá vir, mas ainda não existe... (Itagiba José)
Sendo fato e é que o amanhã não existe, quando ele chega deve ser acolhido e saudado como realmente se torna, um novo hoje, uma nova chance de nos tornarmos melhor do que fomos naquele hoje que já é ontem e não voltará jamais... Recebamos esse amanhã que chega e se torna hoje, no mínimo, com o aplauso de quem se sabe vivo, pleno desse milagre radiante e transitório chamado vida e ele não será vivido em vão, como o fizemos com tantos outros “hojes” que já se tornaram ontem, desperdiçados por nossa ignorância, vicissitudes e medos...

Saliente-se que o valor de uma pessoa não está condicionado, para maior ou menor, pelo quantum que materialmente detém, em contas bancárias, propriedades ou finitos bens que possa possuir. Sob o prisma de olhos argentários é certo que são importantes, pretensiosamente definitivos, todavia a moeda do outro lado (e, para a grande maioria que acredita, existe esse outro lado) não é o vil metal que nos sufoca e nos delega uma reles importância que não tem, lá a moeda é outra, traduzida pelo que realmente deixamos à posteridade, às ações desenvolvidas pela alma e coração sem máculas, movidas apenas pelo simples prazer, o maior deles creiam, de servir, de se dar sem pretender troca ou vantagens. A dádiva provoca maior regozijo em quem a oferta do que naquela pessoa que a recebe; isso, todos os que assim agiram, bem o sabem e consagram.

Quando se encontrava em desentendimentos que se tornaram graves pelo acúmulo de situações comezinhas, diálogos interrompidos, palavras soltas que adquiriram significado negativo ao serem retiradas do contexto que integravam e outras situações que se enfrentadas, esclarecidas de imediato, não geraria tanto desacerto e desunião a ponto de afastá-los, um pai, com o amor que sempre acompanha e rejuvenesce todos, com compreensão e meiguice que o passar em anos lhe trouxera, expressou, por escrito, à sua amada filha a mensagem ora reproduzida:
Filha, em algum lugar li que se deve proceder como a água, que contorna os obstáculos, superando-os sempre. Desejo que assim procedas em tuas atividades profissionais, sociais e, mais importante, afetivas. Que tua relação familiar não se deixe contaminar pelos pequenos obstáculos cotidianos que, se não contornados, podem finalmente ocasionar fortes danos ao relacionamento; construa lar em tua casa o que todos anseiam, poucos conseguem. A paz, a compreensão e o amor são luzes permanentes dos justos de coração e desejo, sempre te acompanhem. Perdoe os que erram pois são humanos e como tu sempre encontrarão abrigo em suas próprias razões, cegueiras e medos. Despreze mazelas, “fofocas” e maledicências, deixando fluir a bondade que te reveste e, bem assim, haverás de vivenciar e aproveitar o dia, todos os dias, de tua existência. Sê misericordiosa com os fracos, forte entre os fortes, plena de amor, graça e perdão junto aos que te são caros; não julgues nem mesmo quando, aparentemente, tenhas todos os dados para fazê-lo, lembrando-te que, adiante, sempre se colhe o que se planta. Conte sempre comigo que a amo mais do que a mim mesmo. Seja Feliz, muito Feliz!”(Itagiba José).

O paternal conselho diz bem do sentimento que o reveste; se existentes problemas, seja como a água que contorna os obstáculos; mas, se não for possível e tiver de enfrentá-los, o faça com lisura e honradez e, ainda que se saiba uma pessoa derrotada de antemão por eles, ao fim e ao cabo terás vencido porquanto terás descoberto em ti forças que sequer sabias portar, necessárias a tua própria sobrevivência digna. Convença-te que de todas as atitudes, a pior é a fuga, ela te humilha e enfraquece, fazendo a pessoa esquecer que nada, exceto um Tudo chamado Deus, é maior do que ela e que nada pode derrubar para sempre, aquele que se sabe, age e se pensa justo. A mente é uma fonte de fé e força, intransponível quando assentada na verdade e (quase) tudo pode. Também importante é sonhar em vigília pois que o sonho é, sem sombra de dúvidas, a ante-sala das realizações e o refúgio de todos os infortúnios. E se estiveres no fundo do poço, como muitas vezes nos traímos somente em assim pensar, saiba que a saída está acima de tua cabeça e por mais fraco que estejas ou te sintas, tuas mãos, pés, corpo e coragem são instrumentos que se encontram em ti, ao teu alcance, basta quererdes acioná-los. Não cometas o erro de esperar a ajuda de outros se tu mesmo antes não te ajudares, eles, os outros, virão trazendo sua ajuda e conforto quando virem que não te entregastes e bem assim mereces tanto.

Não se deixe molestar por pequenas armadilhas que o cotidiano oferece. Pense grande, não faça de si um detalhe, seja a essência; não tropece ou se deixe contaminar por vírgulas, vá ao texto integral bebendo na fonte perene da fraternidade, compreensão e clareza, o que realmente importa.

Todos os dias, estamos aprendendo! Por isso, não te julgues sábio e nem de perto te deixes vestir pelo horripilante manto da soberba. Em qualquer circunstância sejas tu mesmo, autêntico, sem subterfúgios e teu “eu” estará no teu retrato e tua estrada repousará em tua mão. Não culpes o destino pelo fruto colhido; antes, olhes o que plantaste, qual semente regaste, lembrando que tu és terra e o teu suor é o sal e o sumo de tuas realizações.

Quando errares involuntária e culposamente, e errarás muitas vezes pelo simples fato de que és humano, seja uma pessoa misericordiosa consigo mesma, já bastam às pedras que outros jogarão, quem sabe até com um ranço de ódio e inveja, para remirem teus erros. Porém, se errares voluntária e dolosamente, seja uma pessoa dura consigo mesma e não esperes de terceiros um perdão que nem tu mesma poderás conceder-te sem que tenhas sorvido, até a última gota, o intragável líquido trazido pelo cálice do remorso... Não há desculpas, nem as queira encontrar, para o mal que está sempre à espreita. Cuida-te e afasta-te dele, não o releves, subestimes ou te torne caixa de ressonância de sua desfaçatez e perdição. Para isso, no mínimo é necessário que acredites em ti e nos princípios sadios que um dia portaste e que vivências tortas, quem sabe, fez com que os negligenciasse...

É preciso crer e praticar, verdadeiramente, isso tudo, pode ser que assim não se mude o mundo, todavia muda-se, para melhor, o universo que é próprio, único, exclusivo de cada um e que é construído todos os dias por nossas próprias mãos, gestos, atitudes e, bem o sabemos, gostaríamos de o encontrar como imagem límpida, alva, cristalina, pura e sem mácula, ao olharmos no fundo de nós mesmos.

E quando te sentires atingido pela maledicência alheia, injustiçado e, adiante, tenhas a oportunidade de revidar, no mesmo ou em maior tom, não esqueças que és muito maior que a vingança, que esta tem o amargo gosto do fel, nada tem de bom e por isso não pode gerar qualquer tipo de felicidade. Mesmo a pequena vingança é inútil, descolorida, sem nexo ou efeito, como aquela praticada pelo menino que até os dez anos jamais tivera sapatos e, um belo dia, ao receber de presente um par, calçou-o e, como primeiro ato, correu ao campo pisoteando, esmagando rosetas, mesmo sabendo não mais serem as mesmas que um dia feriram seus pés. Sua alma ficou menor, pois não percebendo a essência e significado para si daquele par de sapatos, deixou de interpretar e vivenciar toda a magnitude, proteção e tudo mais que o calçado lhe trouxera e oportunizara. Não viveu a plenitude desse momento feliz, ao contrário, preferiu pisotear e esmagar rosetas... Inúmeros fazem isso de suas vidas e nela se comportam como aquele menino...

Guerra, violência, ódio, são filhos dos mesmos pais, preconceito e intolerância. Não existem guerras justas, santas ou com qualquer adjetivação positiva; os motes que as produzem, individualmente ou unidos, são questões religiosas ou questões econômicas, ungidas do aparato vital à guerra, a prepotência. Violência se irmana à impunidade, um portentoso mal que solapa, dilapida, extingue a moral e a ética.

O ódio é o amor doente, segundo a correta definição de Cardenal, poeta nicaragüense. Para odiar é preciso antes ter amado, por isso o mal que dele provém faz menos estragos do que a indiferença, esta sim a maior vilã de todos os tempos, pois que transforma o homem em icebergs a procura de “titanics” e, de uma só vez, expulsa a solidariedade, a fraternidade a real compreensão e grandeza que reveste ou deve revestir, sendo a essência do ser humano. De todos os sentimentos, o pior é a ausência deles que chamamos de indiferença. O gelo gela e queima não apenas para confirmar a dialética de Hegel, todavia para dar a extremada amplitude da ausência de sentimentos, do não se importar com este nada que, esquecemos, está contido no tudo que sempre buscamos.

Infelizes aqueles que se deixam contaminar pelo fanatismo, seja ele de que natureza for. O fanatismo é aberração, negação de valores individuais pela desinformação radical que o professa e estimula. Revigora-se em si mesmo e transforma o homem na besta fera que, pretensiosamente, enxerga naqueles que não comungam de suas crenças e credos. Ele não dialoga, tenta impor pela força o que acredita. Por isso muitos compram “cadeiras no céu” e saem por aí, vendendo a ilusória condição que os leva a se acreditarem portadores de uma verdade absoluta. A verdade absoluta não existe. E se olharmos com profundidade tudo isso, a gênese dessa verdadeira lavagem cerebral que atinge tantos fracos, lá estará alguém levando vantagem pecuniária, o bendito-maldito dinheiro dando cartas e jogando de mão. Ao que tudo indica não tem maior ou mais lucrativo negócio do que a comercialização da fé, quanto mais cega, melhor para os magos que transformam os incautos, tantos fracos e desassistidos, em fontes de barbáries, alto-falantes propagadores de panacéias e ilusões. Em resumo, enquanto alguns continuam se exercitando e se consagrando como vendilhões em troca de moedas, outros, milhões, esquecidos de que o Deus e a Igreja que buscam fora, está dentro de si mesmos, se entregam ao fanatismo de que foram contaminados. Pior, saem por aí contaminando outros, na triste ilusão de que são enviados dos céus... Quanto desperdício de amor, boa-fé e caridade, por um nada ou quase nada...

A Bíblia, por exemplo, o maior de todos os poemas, tem ou dá publicidades na mesma dimensão dos relatos e verdades trazidas pelo Alcorão ou pelo Tora que também, como ela, são sagrados. Todavia, se analisarmos qualquer desses monumentos literários, poemas da maior relevância plenos de metáforas e lições inesquecíveis, com isenção e com um mínimo do conhecimento que hoje possuímos, apenas com os olhos materiais, dissociados do contexto relativo em que foram criados, afastados da idéia de que são poemas excepcionais, mesmo que, cada um, tenha sido consagrado e ungido pelos mistérios de um Deus único, logo chegaremos a conclusão que ali tem relatos que não são tão sagrados assim e nem Deus, seja Jeová, Alá, ou Tupã o seu nome, os assinaria ou daria como sua algumas dessas peripécias narradas.

Exemplifica-se, para não cair no vazio tal afirmação: a certa altura, assevera uma Bíblia que li, que Joel, um dos profetas menores reproduzidos pelo Aleijadinho na escultura perenizada em pedra sabão em Minas Gerais, teria parado o sol, o que não pode ser verdade pelos menos se analisado dito feito sob o prisma e conhecimento portados pelo homem atual. À época, dentre uma mão cheia de teorias equivocadas, acreditava-se que a terra era o centro do universo, com o sol, como os demais astros, orbitando em seu redor. Pois bem, agora que se sabe que o sol é uma estrela de quinta grandeza, ocupando em nossa galáxia o centro, e que a terra gira em si mesma e em torno dele, e que o sol é a verdadeira fonte de luz, calor e vida, etc, etc, tem-se a certeza dessa impossibilidade relatada, por isso, falaciosa. Para comprovar tanto nem precisamos alçar vôo, basta observar os efeitos de uma boleadeira girada e impulsionada pela mão humana à cata das patas, queda e prisão do rápido e arisco inhanduí (como o gaúcho da pampa denomina o avestruz). Fosse a terra o centro, as bolas dessa boleadeira celeste nada sofreriam pela paralisação de uma delas, o sol; imagine-se porém o contrário, sabendo-se, como agora sabemos, que é o sol o centro... Todos os planetas de nossa galáxia, inclusive a terra, se chocariam, nem Joel ou seu povo restariam vivos, muito menos nós que não estaríamos aqui para contar qualquer história, porque não existiria sequer história para ser contada.

E não se venha com o argumento de que o profeta menor, Joel, teria realizado um milagre e por isso, por ser milagre, não tem explicação e bem assim ele de fato, por milagre, teria parado o sol. Não confundamos milagre com uma ocorrência impossível da qual resultaria o armagedon, acaso ela se verificasse; à fé, efetivamente, dá para se creditar praticamente tudo, todavia nenhum milagre pode ser considerado milagre se dele decorrer uma catástrofe maior que ele e que atingiria a tudo e a todos; sim, porque fosse verdadeiro que Joel teria parado o sol, a terra e a humanidade, por efeitos desse milagre teriam sofrido um colossal, catastrófico, irrecuperável revés.

Milagres existem e cotidianamente acontecem. Basta observar a si próprio ou qualquer outra pessoa, todos são milagres ambulantes, ratificados a todo momento. O milagre de ter nascido, o milagre de continuar vivo, o milagre de realizar, por livre arbítrio, seu próprio caminho, o milagre de ser instrumento de geração de outras vidas, o milagre de se saber presente olhando e esperando o amanhã que ainda, neste agora, não existe, o milagre de se saber tão insignificante quanto um grão de pó e ao mesmo tempo tão imenso quanto o universo único e exclusivo que carregamos em nós...
A propósito, veja-se um recém nascido, seja animal racional ou irracional ou vegetal, e o que se tem diante dos olhos é um livro aberto, sem página escrita que, todavia, em seu âmago trás em si as anotações e heranças genéticas que seus ascendentes lhe transmitiram. Porta o animal racional, o homem, o conhecimento e descoberta do sorriso, da lágrima, acompanhados pelo conhecimento e consciência de sua própria finitude, da morte enfim (física, ao menos) e também desse monumental e corriqueiro equívoco de se pensar dono do tempo e, quiçá, eterno. Ignorando tudo isso, o animal irracional, não ri nem conta seus dias pelo fúnebre conta-gotas do menos. Por causa disso, refletindo sobre a ignorância do animal irracional, muitos creditam que teoricamente a ignorância é uma fonte de felicidade que pode tornar as pessoas que a servem bem mais felizes do que aqueles que se entendem ou são apontados como sábios. Ledo engano, pois que àquela produz a escuridão, esta ao contrário, a luz. Ademais disso, a pessoa ignorante é presa fácil às aves de rapina que dela se servem. Paradoxalmente, entanto, os verdadeiros sábios são conscientes de que sabem bem menos do que gostariam, entendendo que a sabedoria é um deserto cheio de oásis e, no máximo, em sua existência conquistarão um ou alguns desses oásis e que se dele ou deles se descuidarem, as areias, ervas daninhas do obscurantismo, virão soterrá-los. Por isso o verdadeiro sábio espalha o conhecimento que possui, pois se não der a devida publicidade, de nada o mesmo terá valido e no oásis descoberto evaporará a água sem que a humanidade possa bebê-la.

Ah! O sorriso, a gentileza, são chaves que abrem qualquer porta. Usem-nas sempre, desde que não se abdique de seus princípios, sem resvalar à subserviência ou se deixar seduzir pelos pretensos poderes e ostentação gratuita dos poderosos. A humildade e a esperança são dádivas que jamais devem ser abandonadas ou subtraídas de teu ser. Não confundas, entanto humildade com humilhação e a esperança com sonhos tresloucados, lembrando-se que mais forte que o carvalho é o junco, pois que, este se dobra mas não se quebra ao vento. E quando estiverdes cansado, triste, deprimido, lembrai-vos do que José de Alencar expressou como última frase (mais que isso, um verso) de “Iracema”, “...tudo passa sobre a terra”. Tuas dores e alegrias também passarão, como tu. Um dia o amanhã não virá para ti e nem por isso o sol deixará de nascer com todo seu esplendor para os que continuarão aqui até ali adiante. Não te decepciones se não conseguires firmar-te como uma árvore frutífera ou produtora de madeira forte necessária à construção de casas e sonhos, não esqueças que podes ser como o umbu (árvore oca, de madeira mole sem serventia e que também não produz frutos comestíveis) que em sua copa dá sombra e abrigo para terceiros, por isso mesmo não menos importante que as outras árvores...

Não tenhas medo da morte, é desperdício inconsequente ter medo do inevitável. Viva de forma que, ao morrer, se confirme a expressão cunhada por Ernest Hemingway no fecho do romance “Por quem os sinos dobram”, que informa que toda humanidade perde quando a morte ceifa uma vida e àqueles que perguntarem por quem os sinos dobram, seja respondido que dobram por eles mesmos que mantém o sopro de vida que, então, te terá abandonado. Tenhas medo, sim, de não aproveitar o doce, amargo, salgado e adstringente sabor da vida. Ela está em ti, faça dela o melhor que puderes. Vive-a com o delírio dos que creem.

Mantenhas sempre, não importam as vicissitudes em que te vires jogado, acesos teus ideais. Embora todos os desconfortos, a magia dos ideais te fará mais humano, atuante, vivo. Não dilapides teus sonhos de quando criança, porta-te como uma quando estiveres em meio a elas. Dá atenção e apreço às pessoas que fazem parte de teu cotidiano e mesmo aquelas que passam por teu destino, sem tempo de serem reconhecidas ou amadas. O mundo necessita de teu amor imensurável, não se deixe esturricar a alma pela falta dele que está em ti e muitas vezes pede socorro para viver toda sua plenitude e grandeza na entrega que deves ofertar a todos. Não te deixes intimidar ou diminuir diante dos infortúnios, tens a liberdade e o dever de vencê-los pois que és feito de um barro sobre o qual realizou-se o milagre do ser. Não tenhas, sejas; no andar, caminho e sonho dos outros, não sejas, estejas como um facho, distribuindo luz, compreensão, afeto e paz.

Cultives a amizade, o melhor e mais divino de todos os sentimentos, sem outros interesses que não o bem estar da pessoa de quem és amigo. Esse amor não se explica ou justifica, apenas se doa sem prevenção ou entraves.

Sejas bom. A bondade, mais do que virtude, é obrigação. E bem assim, exercitando-a, estarás compondo a maravilhosa sinfonia do sim e cumprindo com louvor o que desde sempre te foi destinado.


Independentemente de posição social ou poder do agente, o futuro é um obstáculo escuro e sem legendas, como um pântano a espera de ser drenado. Embora se possa desejar, para si ou terceiros, apenas o que na páscoa se efetiva, nela não se chega sem antes passar pela dor da Sexta-Feira Santa. Por isso, necessário entender que a dor, o sacrifício cotidianamente presente em nossas vidas e sob diversas formas vivenciados pelo ser humano funcionam como catalisadores de nossas próprias mazelas e resultantes de nossos próprios erros assim cobrados, porém e também, esse caldo de cultura pode ser transformado como início de futuras realizações.

Ofertando os poemas, infra, pretende-se enfatizar, demonstrar o supra afirmado na forma de prosa, buscando, através das metáforas e musicalidade que modestamente se entende neles contidas ampliar, ratificando, a universalidade da simplicidade que permeia o presente ensaio.

RETRATO DO AVESSO                                CONTINUÍSMO

De súbito, entendi!                               A humanidade, no alvorecer do terceiro milênio
É o tempo o senhor                geme à busca, por qualquer meio, dos inteiros
Sou apenas o súdito               sempre perdida em emaranhados de problemas
Sem queixas ou pudor.          Prostra-se à eternidade dos esquemas fracassados
Então, assim, percebi            Nada vê além do umbigo, momentos no escuro,
Que o sim e o não                  o egoísmo corroendo o agora, futuro, pensamentos
Em qualquer versão           pensa inocente que nada fica na corrida dos segundos
Ou mesmo endereço           exceto a dor que estraçalha os trajetos deste mundo.
Não tem razão de ser
Ou ter, tudo é começo.
Minhas escolhas                     E o escárnio estancou o riso, fez do abraço o açoite
São folhas soltas                     e do latifúndio da ironia brotou o espaço da noite
Que reprimem orvalhos        dilacerando o dia que morreu triste, sem aviso,
Do ontem, de atalhos,             preso às queixas do cotidiano, sem improviso.
Que, sem me dar conta,         Assim se esfola inteiramente a humanidade
Despedacei em tédio.             em tristes e obtusas figuras de jogos difusos
Pretenso remédio                   dos seres gregários que arrastam pelas cidades
Que não faz a cura                 os pesados fardos de seus egos sós, confusos.
Das tantas juras
Do inalcançável                                         DEIXEM-ME O AMANHÃ
Que, indisfarçável,                 Tirem-me tudo, se assim entenderem que mereço
Em mim repousa.                   Exceto o amanhã que não tenho, nem conheço.
Presas do tempo                     O homem vive de perspectivas,
Todas as coisas                       de fantasia, da utopia e seu adereços
O bem, o mal                           e o que paga pelo hoje que já vai ontem
Ir-se-ão sem ter                       é o resultado de suas ações e omissões.
O som do agora,                      justo ou injusto, paga-se o preço.
Do meu sofrer                         O amanhã que nunca tenho, pode trazer
E dos gozos meus...                 em suas dobras o que me falta para só ser
Todos os sabores,                    ao final, inundando o leito seco do riacho do agora
Dos meus amores,                   com águas puras originadas d’outras auroras
De minhas dores,                    e meus excessos na dor que espanca
No agridoce do adeus!           nelas banhados renascerão em esperanças.

                                                 Vida na vida, sonho encantado, o avesso
                                                 destes tempos rudes que vivo e sei, mereço!
                                                 Tirem-me tudo, menos o amanhã
                                                 Que não tenho e nem conheço!

                                                                                             (Itagiba José)