segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

TRISTE FIM DA FANTASIA DO NATAL


(Este poema, escrito por volta do final de 2013 ou 2014, é dedicado ao meu amigo Evandro Job Junqueira dos Santos que deixou de ser o Papai Noel de tantas crianças, ao iniciar outra religião).


Amigo estou preocupado contigo,                                       Ora, te reencontro e, acho, tão triste Parece-me que estás em perigo                                            Com frutos amargos, colhidos
Agonizando solidão. Comedido,                                          Sem sumo, perdidos, sem rumo, saíste
Em busca do teu eu, esquecido.                                           Ao acaso fugaz do fugaz imerecido.
Que certas são perdas e ganhos                                           Não quero interferir em tua fé,
Como partes do todo da vida.                                              Nem maculá-la com minha rudeza
Certo, também, do que plantamos                                        Mas nenhum Ser Divino que É,
Faz-se a colheita merecida.                                                  Prescinde de magia ou beleza.

E tu que plantavas esperanças                                              De buscar o saber e a quimera
No infinito voo de tua magia                                               Também, nos contos de fadas,
Revigorando para tantas crianças                                         Pois sonhos e assim se espera
O inocente tudo de tua fantasia.                                           Alimentam corações e almas.
E quanto mais denso o mergulho                                         Por isso, salva teu Papai Noel
E quanto mais imensa a paixão                                           Que distribuiu alegrias, presentes
Teu sonho clareando escuros                                               Materializados bem além do papel
De universos sem ilusão,                                                     Às crianças, de fé e esperança carentes.
Se fez verbo e se fez vivo                                                    Creia-me, caro e puro amigo,
No verso sadio de uma lenda                                               Voltar à fantasia de Noel, podeis,
Que se sabe, mais que improviso                                         Sem receio, culpa ou castigo,
Está muito além da oferenda.                                               Na louvação do Rei dos Reis.

                                           E, se minha ignorância não faz estrago,
                                           Foi São Nicolau, o Papai Noel original
                                           Que a pretexto de imitar os Reis Magos
                                           Iniciou o costume de celebrar o Natal,
                                           Na data apontada pela maioria
                                           Como do nascimento de Jesus
                                           Doando, como tu, naquele e todos os dias,
                                           Natais de Amor, Fantasia, Paz e Luz...

AMARELINHA


Era como se fosse noite                Era como se fosse o depois
Não era como se fosse dia.           Não, era como se fosse e foi.
Era como se fosse dia                   Era como se fosse o não era,
Não, era como se fosse noite.       Não, como se fosse, deveras.
Era como se fosse ontem              Era como se fosse quimera
Não era como se fosse hoje.         Não como se fosse, pudera.
Era como se fosse hoje                 Era como se fosse a vida
Não, era como se fora ontem.       Passando naquela esquina
Era como se fosse um não            Distraída, inerte. esquecida
Não era como se fosse sim.          Sob uma gélida neblina...
Era como se fosse o sim               Era como se tudo viesse
Não, era se fora um não.              Pelo adeus dos vencidos
Era como se fosse e não foi         O que fora ou estivesse
Não, como se fora depois.             Era como nunca ter sido...

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

OUTRAS DO MOLEQUE - HISTÓRIAS DE FUTEBOL


Então, era assim, invariavelmente... José Nilto Guirland, o amigo-irmão do Moleque, jogava muita bola, era o “Pelé” de qualquer um dos tantos times em que era convidado para jogar, indo o moleque de carona ou contra-peso... Quando vinham convidar Guirland para jogar no time, os interessados ouviam a mesma pergunta de sempre: “Convidaram o moleque para jogar?... se ele for, eu vou...”. Adivinharam?, é claro que convidavam o moleque...

Assim o moleque era convidado, sempre... exceto na vez que, para confirmar a regra, veio o Taióba, dirigente do Cruzeirinho FC, direto no moleque e o convidou para jogar no seu time, ao que o moleque realizou a clássica pergunta:
  • Já convidaram o Guirland?”, tendo como resposta um surpreendente Não, sequer pensei nisso...” -.
  • Bom, se importa se eu convidá-lo? é que...”
  • Que é isso, seria muito bom se ele aceitasse, faz isso, moleque...”.
  • ...
  • A açodada interrupção da frase denunciava a artimanha do dirigente, o que, então, passou despercebido pelo moleque deixando-o cheio de razão e contente, afinal fora a primeira (e única) vez que alguém o convidara antes de tê-lo feito ao Guirland...
Interessante, o Moleque era o único que enfrentava o grande astro, amigo-irmão, e durante todo o jogo de que participavam, ambos discutiam a cada lance, brigavam entre si resultando em diferenciação absoluta por sobre a pasmaceira dos demais “atletas” que se esforçavam esbanjando vitalidade e calma diante das corriqueiras admoestações do astro irritadiço que sabia tudo de futebol reinando por sobre os demais que não detinham, nem de perto, sua irrepreensível e elevada técnica. Por qualquer “me dá cá aquela palha” a discussão iniciava e corria solta, “sem papas na língua”:
  • Puxa, te dei uma bola redonda, me devolveste uma melancia... qual é, pô!”...
  • “ Essa tua bola não foi tão redonda assim, faltou gomos e sutileza; a dividida foi mais p'ro zagueiro do que p'rá mim e vens dizer que joga bola... ora bolas, tu pensa que joga, só pensa mas não joga tudo isso... melhor é 'enfiar a viola no saco' e jogar a tua 'bolinha' bem quietinho...”
  • Tu é que parece que não aprende... falta te esforçar mais... vai lá, vê se desta vez faz   alguma coisa que preste e marca os caras, pô!...”
E assim sucessivamente, durante todo o desenrolar do jogo, tal cantilena entre ambos liberava os demais para que pudessem jogar o futebolzinho deles bem tranquilo ou quase isso. Findo o jogo, os dois amigos saiam de campo conversando animadamente 'esquecidos' das interminááááveis discussões durante todo o tempo protagonizadas e do aparente antagonismo rançoso que, também aparentemente, às contaminava... Embora, de tantas vezes repetidas, achassem que tudo não passava de 'charme' dos dois, na verdade nada era programado acontecendo independente e ao sabor do momento esportivo vivido.

Olhando de longe, entende-se agora que nem o moleque, nem o astro, sabiam que ao expressarem direta e tão claramente, entre si, divergências de opiniões e posições extraídas das personalidades individuais que possuíam, envolvidos pelo sentimento comum da amizade pura e fraterna que os irmanava, mesmo no choque infanto-juvenil intuitivo das discussões havidas, declaravam o grande respeito como a base que os mantinha incólumes e afastados dos nefastos efeitos de atitudes desprezíveis como a inveja ou a deslealdade. Também, e logo adiante, afirmavam o valor perene e maior da amizade sobrepujando a todo e qualquer outro por mais rutilante que fosse; aliás, a renhida discussão havida não continha qualquer poder de fogo ou beligerância, nem nela se buscava a vitória inconsequente e fugaz, sim luz e solução do problema considerado, mais ou menos dentro de conceito ou pensamento já publicado, verbis: “A luz que cega meus olhos deveria ser a luz que ilumina minha estrada, à frente”, competindo ao 'detentor' da fonte de luz, direcioná-la da forma mais salutar e amorosa cabível, isto é, à “...estrada, à frente...”. Pois bem, creio que ambos amigos detinham a fonte e dirigiam, quem sabe tortuosamente, o facho de luz à frente das estradas, como se cruzassem os “sabres de luz” apontando-os um à estrada do outro e vice-versa.

Entretanto, paremos dessa vã filosofia seguindo adiante com o moleque e seu amigo irmão que, apesar de tudo, eram antagonistas em quase tudo; em Uruguaiana, Guirland torce para o EC Uruguaiana, o moleque para o EC Ferro Carril; já em Porto Alegre a querida e linda capital gaúcha, àquele torce pelo imortal Grêmio FB Porto Alegrense, o moleque, pelo glorioso campeão de tudo, o SC Internacional. Tendo em vista a facilidade de acesso às emissoras AM do centro do País, Guirland torce para o peixe, Santos FC, o moleque para a academia, o Palmeiras, no Rio de Janeiro, o primeiro para o Flamengo, o moleque, para o Botafogo... Não “fechavam” uma que fosse, esportivamente antagônicos em todas as praças. Praticavam, também, Jogos de Botão e cada um deles com times fortes que sobrepujavam os demais, todavia, entre si, marcadamente por uma igualdade assustadora, entre o Santos e o Palmeiras, grandes clássicos, muita “flauta” de um e de outro...

Nesses inumeráveis enfrentamentos, do lado do Santos de então, tinham botões com os nomes de Dalmo, Mauro, Calvet, Geraldino, Zito, Formiga, Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pagão, Pelé, Pepe, etc, e os goleiros Laércio, Gilmar (que não eram botões), logo adiante, Edu e tantos outros; do lado do Palmeiras, dos goleiros Oberdan, Valdir, Anibal, etc., os botões com os nomes de Djalma Santos, os Valdemar Fiúme e Carabina, Geraldo, Berto, Zequinha, Ademir da Guia, Chinezinho, Julinho Botelho, Mazzola, Humberto Tozzi, Jair da Rosa Pinto, Vavá, Rodrigues, logo adiante, Adhemar Pantera, Cesar, Djalma Dias, Luiz Pereira, Leivinha e tantos outros...

Porém, se no jogo de futebol propriamente dito Guirland dava goleada no moleque, pelo indesmentível e imensurável talento, nos botões a história era bem diferente...

Aquela gurizada, com muita “fome de bola”, então se reunia na esquina do Seminário, pelo lado da Rua General Câmara, onde se localizava o 'bolicho' (armazém, venda de secos e molhados) do “Seu” Araci Castelhano, que era identificado pelo nome de “Olinda”.

Abra-se um parêntesis para uma inconfidência, o Guirland estava altamente enamorado por uma das filhas do “Seu” Araci, a bela Nair, que também dava sinais através de olhadelas seguidas de corridas e esconde-esconde próprios do namorico e indicativo de correspondência à afeição exalada dos olhos aflitos e cegos de luz, de Guirland. O problema era driblar a vigilância do “velho”; o moleque, então, se encarregou de “distrair” “Seu” Araci, e acomodando-se por sobre sacos de 50 ou 60 quilos de arroz, açúcar, feijão etc, empilhados à frente do balcão de concreto onde o “bolicheiro” escorava os cotovelos, o corpo e a paciência para ouvi-lo, iniciava uma conversa fiada improvisada que mantinha o irascível pai ali, sem se voltar para o interior ou pátio de sua casa, menos ainda, para os fundos que fazia fronteira aos trilhos da linha férrea, separados por cerca de arame farpado e vegetação tipo árvores de Cinamomos, chamadas de Paraíso, Maricás e outras plantas e até urzes tipo guanxuma, onde, à esquiva, Guirland e Nair, sorriam ao bailado xucro das piscadelas, das olhadelas furtivas e envergonhadas, ruborizadas à inocência estampada. E, saibam que anos depois, casaram, tiveram três filhos - um guri e duas gurias – tendo, então e só então, o “Véio” Araci descoberto que fora enrolado por dois piás muito amigos e muito sapecas, um querendo sua filha, o outro, arremedo de cupido sem cerimônia, mantendo-o preso, escorado ao balcão, enquanto... (diga-se que, se Guirland e Nair não tivessem casado, não sei qual seria a reação de “Véio” Araci Castelhano, aquele bonachão, meia-boca, total/parcialmente bravo e/ou zangado...).

Feche-se o parêntesis e voltemos a vaca fria, um dia (que quase ninguém sabe precisar qual) aquela gurizada reunida ali, naquela esquina, que volta e meia se dispersava, distribuía por entre vários times, baseada na formação do antigo time em que todos jogaram e que fora desmanchado, o “Antena”, depois “Uberlândia”, cuja “cancha” localizava-se na área da antena da Rádio Charrua entenderam que era hora de criarem um time só deles e que os representasse pelo menos quanto ao bairro em que viviam; todos sabiam da existência do Baixadinha, do América, do Sete de Setembro, dos Internacional, Independente, Charrua, Esperança, Ipiranga, Farroupilha, etc., todos tendo em comum a representatividade de seu respectivo bairro.

Decididos a tanto, agora faltava dar nome ao time e, alguém gritou, porque não acrescentar FC ao Olinda da Placa do “bolicho” do “véio” Araci Castelhano. Por unanimidade, foi ali criado o Olinda Futebol Clube, que viria fazer história naqueles tempos pela longa invencibilidade que ostentou (nada menos do que 71 – setenta e uma – vitórias consecutivas).

Um ou dois anos depois, os três clubes de futebol profissional da cidade, (EC Uruguaiana, EC Ferro Carril e Sá Viana FC) resolveram seguir o bom exemplo das escolas que promoviam os Jogos Primaveris - disputa de diversas modalidades esportivas por estudantes dos primeiro e segundo graus - realizando campeonato das equipes com jogadores de até 15 anos de idade, com cada clube se preparando para disputá-lo nestas condições.

O Ferro Carril cujo estádio, dos 'Eucaliptos', era não mais do cem metros distante do 'bolicho' Olinda e, por seus dirigentes, foi até lá e, constatando que todos seus jogadores tinham idades menores do dezesseis anos, na prática, 'contratou' todo o time do Olinda FC transformando-o em sua equipe para disputa do supra citado campeonato. Lembrando-se do amigo torcedor do EC Uruguaiana, o moleque disse-lhe que se ele quisesse iriam àquele clube, até porque o presidente do mesmo era seu tio; Guirland se recusou a fazê-lo e, ambos, ficaram junto aos demais e agora envergariam a camiseta vermelha e branca do Ferro, listrada tipo Bangu ou Náutico.

O treinador do Ferro era uma pessoa amiga do pai do moleque, compadre dele. Nos preparativos e treinos, surgira um bom jogador que não era da turma do Olinda, um guri que trabalhava nas Casas Pernambucanas e que, de fato, jogava muito mais que o moleque, se adonando da posição deste, que fazia pare do meio-campo, tipo Zagalo da copa, meio formiguinha mas pecava por falhas de marcação enfim, não sabia marcar, era uma avenida sem porteira, todavia era amigo do Guirland e dominava e batia muito bem na bola a ponto de ser o cobrador oficial de faltas, inclusive de penaltis...

No primeiro jogo preparatório, contra o SáViana, o moleque ficou no banco de reservas; pelos trinta minutos do primeiro tempo, o Ferro perdia o jogo por 2x0 e o Guirland que não gostara de ver seu amigo na reserva, desde os 15 minutos vinha na beira do campo e quase berrando dizia ao treinador “Bota o moleque, pô!”...não surtiu efeito seu pleito continuando impassível o treinador; no intervalo, Guirland, continuou a peroração irritada, e nada... no campo e como sempre, ele discutia com todos os demais jogadores do seu time, seus súditos, faltava-lhe algo, não jogava bem, nada dava certo... Quando o jogo se encaminhava para o final, por volta dos trinta minutos do segundo tempo e o time levando 3x0, o treinador se voltou para o moleque e disse-lhe “Te prepara que tu vai entrar!” - “Ahnn, eu, agora?” - “Sim, tu e agora!” - “Mas vai p´rá p.q.p., tá achando o que... eu não vou te salvar, nem entrar nessa fria que tu meteste o time, te arranja sózinho e sem mim, boca aberta, burro!”.

Ato contínuo, despiu-se da sagrada camiseta alvirubra, jogando-a na cara do treinador. Guirland, do meio do campo assistiu a cena final e, em desabalada carreira, veio ao banco de reservas repetindo o gesto do amigo... Foi um alvoroço, e a punição para ambos, branda até, foi suspendê-los com sinalização de expulsão sumária.

Durante a semana, o treinador do SáViana, Mitério (cujo sonho era um dia pisar a grama verde do Maracanã, como repetia à exaustão), jovem ainda e que tivera uma promissora carreira profissional interrompida por uma séria lesão nos joelhos (na época, era sempre problemas de meniscos), ofertou à dupla de amigos a oportunidade de jogarem no seu time... E lá se foram ambos para o 'Estádio dos Álamos', porque o importante mesmo era jogar bola e deu p'ro resto... Treinamentos diários em poucos dias ambos já estavam no time...

Nem bem quinze dias depois, participaram de um jogo internacional, em Curuçucoatiá, cidade argentina próxima a Passo de Los Libres (esta, fica à frente de Uruguaiana). O jogo transcorria normal até certo ponto pois que os argentinos para intimidar baixavam o 'sarrafo' a ponto de se dizer que “do peito p'rá baixo tudo era canela”. A coisa entretanto fluía, exceto pelo ponta de lança do time Paulinho Buteca que, individualmente muito bom, prendia a bola em demasia e não a soltava p'rá ninguém querendo levá-la p'rá casa, perfeito “fome”, egoísta.

Recém chegados ao time, Guirland e o moleque reclamavam do comportamento daquele, sem resultado algum e isso os foi irritando a ponto do moleque sussurrar para o amigo “vamos isolá-lo, não vamos lhe passar mais a bola, pode até estar livre que não vamos passá-la”; assim fez o moleque, n'um lance, sem futuro, 'prendeu' a bola mesmo tendo o Paulinho correndo ao lado desmarcado e aos berros repetindo até cansar “Dá p'rá mim! Dá p'rá mim!”... o moleque nem ligou, carregou a bola até a linha lateral e perto da linha de fundo onde, cercado e sarjado por três argentinos, a perdeu, bem próximo ao treinador que reclamou em altos brados do moleque, “Larga a bola, poxa, futebol é jogo coletivo, larga senão vou te tirar!...”. Levantando-se cheio de dores pelas pancadas recebidas já que carregara a bola e para tirá-la de seu domínio a argentinada tinha descido a pauleira, mais indignado agora pelos berros do treinador, sem papas na língua, não o deixou completar sua frase retrucando-lhe, também aos berros “Vai à merda seu f.d.p., idiota! tu não reclama do Paulinho Buteca que prende a bola todo tempo e tu mudo como uma estátua, agora quer dar uma de durão p'rá cima de mim...”; em resposta, cheio de raiva e rancor pelas ofensas recebidas, gritou-lhe o treinador “Tu vai sair agora de campo...”, ao que o moleque respondeu, “Não só do campo, como do teu time, imbecil!”.

Ato contínuo, outra vez, tirou a sagrada camiseta, agora a tricolor (Verde, Vermelha e Branca, modelo tipo Fluminense) do SáViana e atirou-a na cara de Mitério. Como também ocorrera antes, Guirland viu a cena do amigo e, de novo, repetiu-a em nome de uma lealdade jamais desmentida entre ambos... Imaginem a situação, na volta, derrota por 3x2, com ambos 'encaramujados' no fundo do ônibus... e, de novo, sem time p'rá jogar... que tristeza, que tristeza...

Nem passara muito tempo disso e, apareceu outro convite, especificamente para Guirland é claro e, como sempre estendido ao moleque. Agora era o glorioso vovô, o EC Uruguaiana, presidido por um tio de Guirland. E lá se foram ambos jogar na 'Baixada' ou 'Estádio Filisberto Fagundes Filho'.

No primeiro jogo do campeonato enfrentaram-se no estádio 'dos Eucaliptos' Ferro Carril x Uruguaiana, estando presentes aboletados no Pavilhão social do Ferro Carril padrinho Nemésio e o pai do moleque. À entrada dos times era feita pelos lados do pavilhão, cada time contornava-o, encontrando-se com o outro à frente do mesmo. Envergando o manto jalde-negro (camiseta amarela e preta, idêntica do Peñarol) o moleque ouviu um berro identificando seu padrinho “Sai daí moleque, esse não é teu lugar!...”... tudo bem, disse para seu preocupado amigo, tudo bem, nem te incomoda com isso, meu Dindo e meu pai nada sabem a respeito... (E se soubessem, especialmente seu pai, não só entenderiam, como certamente o apoiariam)... Começa o jogo, ambos sabem da 'pedreira' que vai ser, ali estão seus amigos do invicto Olinda, com Salvador e Deca Parrudo (que, depois jogou no Grêmio FBPA) grandes goleiros, o Deca zagueiro central, Fagundes quarto zagueiro, Gago e Valdir laterais, Luiz Chaves volante, Dorvalino e Pastel nas pontas, direita e esquerda, Júlio e Cesica (irmãos de Oswaldinho que jogou no SC Internacional), pontas de lança, Pedrinho Sabugo e Wilson Guedes centroavantes, dentre tantas outras feras... Ao lado de Guirland e do moleque, desfilavam os não menos 'famosos' jogadores Sérgio Boca (Xucro), os João Carlos Imbido e Melena, Lalo, Jair Gonçalves, Paulinho, Pedrinho, Otto Pires e Jaime, dentre tantos outros...

Por volta dos 38 min do 1º tempo, Juarez Barbat, ponta direita e primo de Guirland sofre falta à entrada da área; encarregado de bater, por uma de suas únicas habilidades futebolísticas, o moleque acerta o ângulo esquerdo de Deca Parrudo que mesmo utilizando asas de pássaros não chega a tempo... bola no fundo das redes! Gol do moleque que parte correndo, parando à frente do banco de reservas do EC Ferro Carril e quase arranca o escudo da camiseta jalde-negra, ostensivamente mostrando-o ao treinador adversário que o relegara à reserva, etc., etc..., n'uma pequena vingança é verdade... O problema é que o banco de reservas ficava bem à frente do Pavilhão Social onde estavam aboletados e, agora, muito amuados, o Dindo e o pai do moleque... Jogo que segue, vitória do EC Uruguaiana, 1x0... e o moleque definitivamente passando desde então a torcer por ele (vira casaca)...

Uma semana depois disso, como já estava decidido pelos pais do moleque este saiu de Uruguaiana para morar, trabalhar e estudar em Porto Alegre, a bela e hospitaleira capital do Rio Grande do Sul que o abriga até hoje...

Quanto a Guirland, continuou morando em Uruguaiana, com sua paixão - a bela Nair e a prole que geraram, sob às bençãos do “véio” Araci Castelhano “Olinda” - junto aos muitos amigos que conquistou por seu caráter e cordialidade, tendo feito bela carreira militar no glorioso 8º Regimento de Cavalaria, atualmente gozando as delícias da 'reforma', cultuando, como o moleque, ainda que separados por mais de 647 Km, a mesma amizade, afeição, lealdade e respeito que os irmanaram desde sempre...

Diga-se ainda que, logo depois de finalizar aquele campeonato inacabado para o moleque, como campeão Guirland voltou ao EC Ferro Carril, na verdade e ao fim e ao cabo, ao grande, glorioso e invicto Olinda FC...