domingo, 27 de janeiro de 2013

OS RATOS (e o GATO) - (Continho)


Os ratos (e o gato!)

Então o gato se ausentou por algum tempo de seu habitat deixando os ratos à vontade. Livres da presença do gato, os milhares de ratos oprimidos resolveram se reunir para analisar uma saída que, obrigatoriamente, afastasse em definitivo o gato e os oprimidos ratos pudessem viver sua vida sem servirem com suas próprias vidas, banquete ao gato.

Daí os ratos fizeram uma assembleia geral e ao som da Marselhesa ou da marchinha “Me dá um dinheiro aí”, começaram-na para decidirem suas vidas... e para presidi-la elegeram um Rato Filósofo.
Um rato velho, de cara pachorrenta, enrugada  e tímida foi o primeiro a falar convencido que a idade lhe dava tal primazia; e disse que dentre os jovens deveriam ser eleitos representantes que seriam liderados por ele, afinal, era o mais velho, mais experiente, etc., etc. Excluindo a si próprio, defendia a igualdade dentre todos os demais. Ele por tudo o que representava, era um igual, mais igual do que os outros, indiscutivelmente... À formação do Estado necessário eleições dos iguais via voto sufragado em urna, com a plebe sendo votante e tais iguais votando e sendo votados. As premissas básicas do Estado seriam a ordem, o progresso na defesa do rato, pelo povo. Ao líder máximo, o comando máximo, aos iguais votados um bocado de poder suficiente para o locupletamento justo e, vez que outra, muito raramente é verdade e nunca no mais igual dos iguais, as moscas poderiam ser substituídas.

Alguns visando ingresso e aptidão para ser um dos iguais votados, aplaudiram a ideia, outros, poucos como sempre nestes casos, já se sentido na condição de votante e executor na prática da defesa contra o gato, vaiaram estrepitosamente; a maioria dos participantes da Assembleia, como sempre, aliás, quedou-se silenciosa...

Nesse pequeno intervalo, um outro rato levantou-se e berrou seu ponto de vista que consistia, basicamente, em comportarem-se os ratos, como o gato e o mais forte, ágil, hábil e inteligente dentre eles, seria eleito o líder, o mais igual, chamassem-no como o chamassem e ocuparia o posto maior de comandante, na defesa do rato, e sob tal liderança todos marchariam contra o Gato, dominando-o, expulsando-o, devorando-o até..

Em cima da fala deste, outro rato anunciou aos berros sua contrariedade pelo que chamou de imposição natural, isto é, a igualdade pretendida não existia quer com relação ao gato, quer com relação aos ratos, entre si; que tal trololó havia varado séculos e custado muito sangue à humanidade ou de todos os insensatos que acreditaram naquela balela. A única igualdade concebível e factível de existir entre os homens derivava, sempre de suas próprias desigualdade. Tentando ser mais claro, vociferou: Nos somos iguais em nossas desigualdades, somente e em tal paradoxo está contida toda a verdade que os enganadores dos sonhos e ingenuidade alheia prezam excluir. A igualdade pretendida era tão fictícia quanto fictícia seria a defesa contra o gato. Defendeu com ardor que era preciso criar-se algo mais concreto que fosse superior a qualquer rato individualmente e a soma de todos os ratos, enfim um consenso mundial entre todos os ratos para marcharem contra os gatos, capaz de enfrentá-los obrigando-os a aceitar a convivência pacífica ou então destruí-los, invertendo a história... Da mesma forma como antes o fizera o velho rato que primeiro falara, este habilmente colocou-se no ponto mais alto da pirâmide social que tentara erigir...

Como das vezes anteriores à reação imediata elevou-se o tom do vozerio infernal, prós e contra vociferavam, pela igualdade, pela liderança, outros ainda, pela força, enfim a assembleia era o caos verdadeiro, a Babel dos ratos.

Por sobre o som da algaravia, ouviu-se o alerta voz de um rato gozador:

“Aí vem o Gato!”

Foi uma confusão geral, gritos, atropelos, fugas, desmaios, prantos, uma tristeza que prostrou até o próprio presidente da assembleia, o Rato Filósofo, que constatou tristemente que a igualdade apenas se cristalizara no medo, concluindo fatalisticamente que para cada milhão ou bilhão de ratos, bastava um gato apenas; pior ainda, a simples lembrança ou menção do nome dele, bastava...

Dissipada a Assembleia pelo corre-corre das aflições e quimeras, o Rato Filósofo que, pasmo, a tudo assistira e se quedara perdido em divagações ficando absorto, solitário, inerte, bem mais fraco do que antes sabia que o era, permaneceu de olhos fechados...

Enquanto isso, o gato que enfim chegara de improviso e faminto, devorou o Rato Filósofo e concluiu, com sólidas razões que os ratos, filósofos ou não eram iguais no sabor pelo menos...
E para o Gato, isso era tudo quanto bastava saber...

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