sábado, 5 de setembro de 2020
COMENDO MELANCIA
Então parei, em meio à balburdia do meu dia a dia /
Ouvi a melodia de um tango antigo, segurei na régua /
O furacão impreciso, furioso, que sopra sem trégua /
Do fundo da vida, pás do moinho chamado outrora /
Que segue girando ironias nas franjas da desilusão, /
Da ausência, da desesperança, dessa antiga solidão /
Que traz tua imagem esculpida na canção sonora /
Destravada, desenvolvida em repetição, labirintite /
Do raspar de uma agulha sobre um LP quebrado /
Golpeando minha existência que sem filtro ou tema /
Se deixa bailar no girar de calcanhares, de teoremas, /
No trôpego andar do trem das minhas esquisitices /
Rumo à poeira dos tempos e deste silêncio pesado /
Que ressoa pelo vento de uma manhã que não veio /
Adormecida no ontem transformado em sementes /
De esperas jamais germinadas e, ao fim e ao meio, /
Naquela melancia, verde como se fosse um espelho /
Do que viria logo adiante, findo o sumo vermelho /
Sugado até a última gota, em um último repente /
Do bandoneon com o fole em derradeiro lamento /
Da inumerável canção que desabrocha momentos.
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